O TESOURO SUBMERSO DE 30 BILHÕES DE BARRIS: POR QUE O BRASIL PODE PERDER A NOVA CORRIDA DO OURO
ENQUANTO GUIANA E SURINAME AVANÇAM, O BRASIL PERMANECE PARALISADO ENTRE AMBIENTALISMO E DESENVOLVIMENTO?
Enquanto você lê estas linhas, algo extraordinário acontece a poucos quilômetros de nossas fronteiras norte: a pequena Guiana viu seu PIB crescer impressionantes 44,1% em 2023, transformando-se na economia que mais cresce no mundo. O motivo? Petróleo. Muito petróleo. Desde 2015, nossos vizinhos já extraíram o equivalente a 11 bilhões de barris da mesma formação geológica que se estende pelo litoral brasileiro – a chamada Margem Equatorial. Um volume que representa surpreendentes 75% de todas as reservas brasileiras atuais. Enquanto isso, o Brasil segue em um impasse burocrático e ideológico que pode custar ao país um tesouro estimado em 30 bilhões de barris de petróleo, aproximando-se do valor total das reservas do pré-sal (50 bilhões).
O TESOURO SUBMARINO QUE PODE REDEFINIR A ECONOMIA BRASILEIRA
A Margem Equatorial não é apenas mais um campo de petróleo. Estendendo-se por 2.200 km, do Amapá ao Rio Grande do Norte, esta região representa para o Brasil o que o Pré-sal representou nos anos 2000 – uma revolução energética e econômica em potencial. Estudos da Petrobras apontam que apenas um único bloco na Foz do Amazonas, o FZA-M-59, pode conter 5,6 bilhões de barris, o equivalente a um aumento de 37% nas atuais reservas brasileiras, estimadas em 14,8 bilhões de barris.
Em termos financeiros, a exploração dessa área poderia adicionar R$ 65 bilhões ao PIB nacional, segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Para contextualizar, isso representa mais que todo o PIB do estado do Amapá multiplicado por quatro. A mesma pesquisa projeta a criação de 326.049 novos empregos formais e um acréscimo de R$ 3,87 bilhões na arrecadação indireta.
A situação lembra um jogador de poker que recebe um royal flush e, por medo ou indecisão, se recusa a apostar. Enquanto hesitamos em uma análise que já dura dez anos (prazo muito superior aos 12 meses regulamentares para este tipo de licenciamento), nossos vizinhos – com estruturas regulatórias e ambientais menos robustas que as nossas – avançam rapidamente. A Guiana, que nem tinha tradição petrolífera, já se prepara para produzir 1,2 milhão de barris por dia em 2027. O Suriname, em apenas três anos, comprovou 4 bilhões de barris em reservas.
O JOGO DE PRESSÕES POLÍTICAS E O FUTURO DO IBAMA
Em fevereiro de 2025, técnicos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) recomendaram, pela segunda vez, negar a autorização para a Petrobras perfurar na Foz do Amazonas1. A decisão final, porém, cabe ao presidente do órgão, Rodrigo Agostinho, que se encontra no centro de um furacão político.
De um lado, o Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, não economiza palavras. Em declaração recente, afirmou que Agostinho “está receoso e não tem coragem” para dar a resposta sobre o pedido de licença. “Há um receio dele de ter coragem de falar com o povo brasileiro qual a resposta dele com relação à margem equatorial”, disparou o ministro. Do outro lado, Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente, tenta manter a serenidade, defendendo que a decisão será “técnica” e não política.
O próprio presidente Lula já demonstrou impaciência com o que chamou de “lenga-lenga” do Ibama, enquanto a recém-empossada ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, defende abertamente a autorização para as pesquisas. Segundo fontes do Planalto, o presidente considera até demitir Agostinho caso a decisão continue sendo postergada.
Este impasse ilustra perfeitamente o dilema brasileiro: como equilibrar o desenvolvimento econômico com a preservação ambiental? A questão se torna ainda mais complexa quando consideramos que o Brasil sediará a COP30 em Belém, no Pará, em 2025, e qualquer decisão sobre a exploração petrolífera na Amazônia terá repercussões internacionais significativas.
A TRANSFORMAÇÃO POSSÍVEL DO NORTE BRASILEIRO
O impacto da exploração da Margem Equatorial vai muito além dos números macroeconômicos. Ele pode representar uma verdadeira revolução para o desenvolvimento das regiões Norte e Nordeste, historicamente menos favorecidas pelo desenvolvimento industrial.
O sistema brasileiro de distribuição de royalties do petróleo direciona 15% para municípios produtores, 25% para estados e 60% para um fundo nacional. Apenas em 2023, a Petrobras recolheu R$ 240 bilhões, grande parte em royalties e participações especiais. Cidades como Macaé, Saquarema e Maricá, no Rio de Janeiro, foram completamente transformadas pelos recursos do petróleo.
Só para exemplificar, Saquarema investe 75% dos royalties em educação e 25% em saúde, além de usar as participações especiais em saneamento, pavimentação e limpeza urbana, transformando-se em um polo esportivo e turístico. Macaé, que já recebeu um recorde de R$ 56 milhões, aplica os recursos em infraestrutura, saneamento e serviços de saúde.
Imagine agora esse mesmo potencial transformador aplicado às cidades do Norte e Nordeste brasileiro. Seria como um “Plano Marshall” regional – assim como o programa americano reconstruiu a Europa pós-guerra com bilhões de dólares, os royalties do petróleo poderiam financiar um salto de desenvolvimento para regiões historicamente negligenciadas, em escala semelhante. O impacto seria ainda mais profundo em estados como Amapá, Pará e Maranhão, onde os indicadores sociais estão entre os mais baixos do país.
OS RISCOS REAIS E A EQUAÇÃO AMBIENTAL
É inegável que a exploração petrolífera traz riscos ambientais, especialmente em uma região de extraordinária biodiversidade como a Margem Equatorial. O Ibama classificou a atividade na região como de “risco máximo”, apontando 18 impactos negativos, sendo quatro de alta magnitude.
Entre os principais desafios estão os possíveis vazamentos de petróleo, agravados pelas fortíssimas correntes marítimas que dificultam a contenção rápida do óleo. Caso ocorra um acidente, a dispersão do petróleo poderia afetar ecossistemas frágeis, como o Parcel de Manuel Luís – a maior formação de recifes de corais da América do Sul – além de manguezais essenciais para a biodiversidade marinha.
A Petrobras, ciente desses riscos, implementou medidas significativas para mitigação. Estabeleceu um Centro de Reabilitação e Despetrolização de Fauna em Belém e está concluindo outro em Oiapoque, no Amapá, projetado para reduzir o tempo de resposta em caso de acidentes de 22-31 horas para apenas 12 horas. A empresa também desenvolveu um Plano de Proteção à Fauna (PPAF), já revisado cinco vezes para atender às exigências do Ibama.
É preciso lembrar, porém, que acidentes como o da Deepwater Horizon no Golfo do México custaram US$ 65 bilhões à BP e causaram danos incalculáveis à fauna marinha e às indústrias locais. Este é um risco que não pode ser ignorado, mas também não deve paralisar o país indefinidamente.
UM CAMINHO POSSÍVEL ENTRE EXTREMOS
O Brasil se encontra numa encruzilhada onde tanto a ação quanto a inação têm custos elevados. Por um lado, ignorar o potencial petrolífero da Margem Equatorial pode significar abrir mão de recursos vitais para o desenvolvimento nacional e para a própria transição energética. Sem novas descobertas, o Brasil pode se tornar importador de petróleo até 2040, conforme alertam especialistas do setor. Por outro lado, avançar sem as devidas precauções ambientais poderia resultar em danos irreparáveis ao nosso patrimônio natural.
O desafio está em encontrar um meio termo que permita o desenvolvimento com responsabilidade. Isso exigiria um processo de licenciamento rigoroso, mas também eficiente, sem que se torne refém de extremismos ideológicos de qualquer lado. Exigiria também transparência absoluta na destinação dos recursos gerados, assegurando que parte significativa seja direcionada justamente para financiar a transição para uma economia de baixo carbono.
Vale lembrar que caso não obtenha aprovação para explorar a Margem Equatorial, a Petrobras já considera redirecionar seus US$ 3,1 bilhões de investimentos para a África, especificamente para a Namíbia, cuja costa seria uma espécie de “espelho” da costa brasileira. Perderíamos não apenas as reservas, mas também os empregos e desenvolvimento tecnológico que ficariam em solo nacional.
A questão que fica é: podemos usar os recursos do petróleo para construir um futuro onde não precisaremos mais dele? Ou continuaremos assistindo nossos vizinhos prosperarem enquanto debatemos internamente? A resposta definirá não apenas o futuro energético do Brasil, mas também seu papel na geopolítica regional e global nos próximos anos.
Excelente artigo meu amigo. Obrigado por compartilhar
Perfeito . obgda
Excelente artigo Anderson, uma pena que nossa máquina governamental é tão lenta, cheia de viés e com muitos “aproveitadores”. Brasil tem tudo pra liderar, mas estamos presos a uma bola de ferro com correntes… Infelizmente !